Catarse(...)1. Purgação, purificação, limpeza. (...) 3.Psicol. Efeito salutar provocado pela conscientização de uma lembrança fortemente emocional e/ou traumatizante, até então reprimida. 4. O efeito moral e purificador da tragédia clássica, conceituado por Aristóteles, cujas situações dramáticas, (...), trazem à tona o sentimento de terror e piedade dos espectadores, proporcionando-lhes o alívio, ou purgação, desses sentimentos.(...) Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (1986)

domingo, 22 de agosto de 2010

Realismo em carne viva

Ele estava magoado. Aconchegou-se entre os travesseiros, e mantinha as pernas guardadas entre seus braços. Buscava por uma posição que já sabia impossível retomá-la ainda nessa vida. Mas naqueles dias difíceis a busca pelo inalcançável lhe parecia uma saída. A única.

Doía-lhe tudo. Mas se um médico lhe perguntasse, não saberia dizer se alguma dor de fato existia. Não era possível ao menos se reconhecer vivo. Aquele corpo ali encolhido, diminuído a tal ponto, que talvez já nem mesmo existisse.

Perguntou-se se havia mesmo motivo para toda aquela dor.

Se por um lado, naquele corpo não havia mais vida, aquela mente ainda pulsava, e o coração ardia. E como ardia!

A carne já não reagia. Mas viver transcende as reações do corpo. Pensar é o pulso da vida. E sentir é fruto do que se pensa. Isso o levava a crer que seu viver andava mesmo de mal a pior. É que seu pensar fazia doer uma dor de morte. E morrer de dor de amor é reincidir na morte a cada suspiro de vida.

Centrou-se de novo na carne desfalecida, flácida, encolhida. Aquela massa desenhava uma escultura. A inexpressividade das formas era tamanha que causaria coquetéis de sentimentos em quem as vissem.

Mas aquilo não era a obra de um escultor sensível. Era o seu corpo, ainda vivo. Era a sua própria carne. Ferida exposta. Era a sua dor sintetizada, intensificada, inexpressivamente expressa. Exposta à sua própria existência.

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